domingo, 28 de agosto de 2022

Em Tempo de se Destruir ou Construir Pontes?

Iam fazer o controle às arvores que ali plantavam, um esforço já levava anos. Passando na ponte sobre a ribeira de Fitares, lembrou-se.

- Sabes da mais recente polémica da "polícia retroativa dos bons costumes"?
- Não sei, nem quero saber. Respondeu, seco.
- Eu conto na mesma.
- Obrigadinho. Conformou-se.
- Querem destruir a ponte de pedra mais antiga da Etiópia, datada de 1620,  porque foi construída por exploradores portugueses
- Não me fodas?
- Disso podemos tratar depois, com gosto. Espicaçou. Agora deixa-me esclarecer que a barbaridade não acaba aqui: é que destruindo a ponte deixam uma série de populações isoladas, ainda mais sujeitas a seca e pobreza.
- Mas esta gente enlouqueceu toda?
- Acho que já não há grandes dúvidas. Se os visses a gritar, encolerizados, exigindo a destruição para "vingar os horrores da colonização". Parecia a Horda Primitiva.
- Será do Efeito de Estufa?
- Sei lá do que será. Só sei que já nem me espanta, sendo sintomático dos tempos que vivemos a Ocidente.
- Numa altura em que devíamos construir e reconstruir pontes, a todos os níveis, não deixa de ser preocupante...
- Foquemo-nos na nossa tarefa, no que de bom podemos fazer e legar, depois de partirmos.
- Sim... 

Calaram-se. Vasculhavam, entre o mato, os brotos da sua sementeira. A alegria de ver uma arvorezinha já composta, sempre se sobrepunha à tristeza de ver que muitas mais eram sistematicamente destruídas, pelas roças obsessivas ou por sabe-se lá o quê. Era esta a sua mais profunda prática espiritual, o exercício de perseverança, em desapego.



Post Scriptum: os eventos narrados desta pequena estorieta são fictícios, pelo que, a bem da saúde física e psicológica não deverão ser tomados ao pé da letra; qualquer afrontamento, surto psicótico ou achaque narcísico desencadeado, com ou após a sua leitura, é da exclusiva responsabilidade do leitor-interpretador.


(Ponte de Fitares | Jehoel)


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