Bosque do Silêncio. Enterro os dedos na terra húmida. Trago duas mancheias ao nariz. Cheiro. O frescor do odor revitaliza. Joeiro, devolvendo ao solo. Examino as mãos sujas, crepitando do jorro de energia que bafam. Desponta aquela canícula ao peito, bem conhecida de poetas, viajantes e amantes. A morte gera a vida. Óbvia epifania. Folhas tombaram, ramos aboloreceram, troncos extinguiram, bichos exauriram. Sinto a genealogia das criaturas que pereceram, para gerar este húmus, endométrio terroso. É provável que se me tenha vertido uma lágrima invisível que, chovendo, regou o primacial substracto. Quão diferente seria o mundo se amassemos a Terra que pisamos, de onde viemos e para onde vamos? Amo-Te, sussurro. Levanto-me, os joelhos estalam. Uma lembrança de que, não sendo “velho”, para lá caminho, se lá chegar. É preciso que o Repórter morra, um dia, ou noite, para manter viva a vida. Se compreendêssemos isso, partiríamos sorrindo, depois de ter consagrado a nossa passagem a um propósito nobre, maior do que a vontade pessoal, aprumado com a Vontade Universal. Reassumo o voto: viver intensamente, prolífico e leal, para aquando da morte, adubar o terreno aos seres do porvir. A coruja pia. Auscultou-me os pensamentos, o tempo todo. Voa. Vou-me com ela.
(Endométrio Terrenal, Jehoel)
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